A Lei Brasileira Anticorrupção, ou a Lei da “Empresa Limpa”, implementada há cinco anos a contar deste mês de janeiro, modificou significativamente a fiscalização da corrupção no Brasil, tornando as empresas vulneráveis a responsabilidade por atos ilegais cometidos por seus funcionários, independentemente da administração ter ciência de tais atos.

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Uma retrospectiva das ações de fiscalização ao longo dos últimos cinco anos mostra que o governo brasileiro está interpretando amplamente essa legislação, incluindo os atos que constituem uma violação da Lei no. 12.846/2013. Agora, mais do que nunca, as empresas são vulneráveis a investigações dispendiosas ou ações punitivas e multas – mesmo que tenham um programa de compliance em vigor.

Testar, Testar e Retestar

Como comprovado por recentes investigações, o desenvolvimento e a adoção de procedimentos de compliance e controles internos não garantem o cumprimento integral da lei; isso só pode ser corroborado por meio de testes. Muitas vezes, as empresas investigadas por violações das leis anticorrupção, como a Lei da Empresa Limpa, de fato têm programas sólidos de compliance. No entanto, o fato de não aplicarem e testarem medidas e controles para otimizar a eficácia prejudicou a credibilidade dos programas e colocou essas empresas sob maior risco de receber sérias punições. Portanto, a existência de um programa de compliance deixou de ser satisfatório; as empresas devem provar que esses programas são completos e eficazes por meio de testes periódicos.

Diligência e Colaboração podem ser Recompensadas

As sanções administrativas resultantes de violações da Lei Anticorrupção podem atingir  até 20% da receita bruta do ano anterior ao início da investigação, ou até R$ 60 milhões (equivalente a US$ 16 milhões) se a receita bruta não puder ser razoavelmente determinada. Sanções civis podem significar a perda de bens ou direitos, a dissolução compulsória ou a proibição de receber fundos, subsídios ou empréstimos de instituições públicas por um período de até cinco anos.

Embora penalidades e multas severas pareçam uma possibilidade, a Lei Anticorrupção oferece às empresas a opção de firmar os chamados “acordos de leniência”. Semelhante aos non-prosecution agreements (nos EUA), os acordos de leniência foram introduzidos como uma maneira de incentivar as empresas a desenvolver e implantar programas completos de avaliação de risco e compliance, autorrelatar violações e colaborar com as investigações. Por exemplo, a Odebrecht concordou em pagar R$ 2,73 bilhões (equivalente a US$ 733 milhões) ao longo de 22 anos, como parte de seu acordo de leniência com a Advocacia Geral da União (AGU), a Controladoria Geral da União (CGU) e o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle. Esse montante, a ser distribuído entre a Petrobrás e outros órgãos do governo federal, será deduzido do acordo de leniência da empresa com o Ministério Público Federal do Brasil (MPF), os Estados Unidos e a Suíça.

Ao longo dos últimos cinco anos, oito empresas investigadas pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle por violações à Lei Anticorrupção receberam com sucesso sanções reduzidas devido a vários fatores, incluindo a evidência de controles internos robustos, análise periódica dos riscos para fazer quaisquer adaptações necessárias, e autorelato de violação à agência apropriada.

Por exemplo, a SBM Offshore – investigada como parte da Lava Jato – firmou um acordo de leniência para identificar e autorelatar a violação, cooperando com o desempenho de uma investigação acelerada e implementando voluntariamente medidas corretivas completas, como melhorar o cumprimento dos controles anticorrupção. [4] Quando o acordo de leniência da SBM Offshore com o Ministério Público Federal (MPF) foi assinado, suas ações subiram 10,7% em um dia de negociação, demonstrando que a Lei da Empresa Limpa ou qualquer lei anticorrupção pode ter um impacto significativo no preço das ações e na capitalização de mercado.

Múltiplas Agências Significam Múltiplos Acordos

Embora os acordos de leniência deveriam ser considerados uma opção para abordar e encerrar um escândalo, as empresas também devem considerar que o Brasil exige acordos separados com cada agência do governo federal, incluindo o Ministério Público Federal (MPF), a Advocacia Geral da União (AGU) e a Controladoria Geral da União (CGU), assim como com os governos estaduais que são tão intolerantes a violações das leis anticorrupção quanto o governo federal. Por exemplo, o estado brasileiro do Espírito Santo criou um fundo estadual para investigar alegações de corrupção e em 2018 emitiu a maioria das condenações dos 26 estados em processos administrativos por corrupção. Muitas vezes, empresas fizeram acordos com jurisdições estrangeiras e o Ministério Público Federal (MPF), mas continuam discutindo acordos com outras autoridades brasileiras, como a Advocacia Geral da União (AGU), a Controladoria Geral da União (CGU) e Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.

Evidentemente, a complexa estrutura de acordos no Brasil custa às empresas tempo e compromissos financeiros substanciais e prolonga o processo para se chegar a um acordo; portanto, as empresas não deverão adiar seus programas de compliance e avaliação de risco.

Gestão Proativa de Riscos e Minimização

Para minimizar o risco da ocorrência de violação, ou, para aumentar a possibilidade de um acordo de leniência estar disponível no caso de violação, a gestão eficaz do risco e sua avaliação, incluindo sua profundidade e frequência, são fatores básicos que o governo brasileiro considerará ao calcular as sanções e considerar a oferta de um acordo de leniência nos termos da Lei Anticorrupção. As principais categorias de risco podem incluir riscos operacionais, de logística, terceirização (subsidiária, contratações, etc.), ambientais, de aquisição ou riscos de corrupção, entre outros. As áreas de maior risco devem ser o foco principal e, à luz da ampla interpretação da Lei Anticorrupção, as avaliações de risco de corrupção devem ser realizadas com rigor e com maior frequência do que anteriormente.

Além disso, dada a natureza do risco de corrupção e a efetividade da fiscalização no Brasil, contratar um terceiro independente e especializado para desenhar, implantar e solucionar problemas em um programa de gestão de risco de corrupção é necessário para garantir um bem-sucedido ambiente de controle anticorrupção, e um especialista reconhecido e respeitável com experiência no assunto poderá trazer validade ao programa. Além disso, o reconhecimento pelo governo, da integridade e competência do perito independente muitas vezes incutirá maior confiança no programa e na sua eficácia.

No entanto, as empresas também devem desenhar cuidadosamente esses controles para que não sejam excessivamente restritivos aos negócios. Isso poderia prejudicar a capacidade da empresa permanecer competitiva, como foi visto quando as empresas de construção envolvidas na Lava Jato encontraram dificuldades em obter financiamento e contratos após a investigação, não apenas por questões de reputação, mas também por controles corretivos restritivos. Os consultores de compliance podem ajudar as empresas no desenvolvimento estratégico de programas de controle para garantir que a empresa tenha um programa de gerenciamento de risco suficiente e, ao mesmo tempo, mantenha uma vantagem competitiva dentro do setor.

Avalie seus riscos proativamente

Embora esteja claro agora que, no ambiente regulatório atual, sólidos programas de compliance são uma necessidade, as empresas precisam dar um passo adiante para avaliar seus riscos de forma proativa e ajustar os controles de forma apropriada. Como comprovado pelos primeiros cinco anos de implementação da Lei Anticorrupção, o Brasil está mais comprometido do que nunca a adotar práticas comerciais éticas e processar aqueles que violam a lei. À medida que avançam nesse ambiente de negócios cada vez mais regulado e complexo, as empresas devem estar totalmente preparadas para cumprir leis como a Lei Anticorrupção e se manter informadas sobre atualizações regulatórias e melhores práticas para reduzir o risco de violação e processos judiciais.

Carrie Meneo, consultora da StoneTurn, contribuiu para este artigo.